Carta aberta à sociedade Catarinense
(Versão PDF, assinada pelo Diretor do DEAP e com referências aos dados estatísticos apresentados disponível neste site, no link: “Downloads>Normativas e Portarias”) O Departamento de Administração Prisional, em nome de todos os Agentes Penitenciários do Estado de Santa Catarina e em consonância com os sentimentos dos profissionais que desempenham o difícil ofício da custódia legal de presos em todo o território nacional, vem manifestar-se publicamente acerca do Projeto de Lei da Câmara Federal nº 87/2011, que previa a concessão do porte de arma aos Agentes Penitenciários quando em folga, democraticamente aprovado pelos nossos representantes legais no Congresso Nacional e vetado pela Excelentíssima Presidenta da República, Senhora Dilma Rousseff. Cabe esclarecer primeiramente a toda a sociedade, que o Agente Penitenciário não faz uso de arma de fogo quando em serviço, dentro das unidades prisionais, fazendo uso deste recurso somente em atividades externas como a guarda de muralhas e escoltas necessárias. Ainda assim, parte deste armamento trata-se, na verdade, de instrumentos de menor potencial ofensivo, ou seja, armas menos letais, com projéteis de borracha ou com descargas elétricas, em respeito às determinações legais e às recomendações internacionais das organizações de Direitos Humanos. A realidade da vivência diária e prolongada dentro de uma unidade prisional, independente de suas condições estruturais e em qualquer lugar da nação, somente é conhecida pelos bravos guerreiros que labutam durante vinte e quatro horas consecutivas sob constante risco de perigo e elevado nível de estresse, naquela que é considerada pela Organização Internacional do Trabalho, a segunda profissão mais perigosa do mundo: a do Agente Penitenciário. Perdendo somente para os Mineradores, cujo o ofício diário sobre o risco de desabamento e intoxicação os fez serem classificados como a mais perigosa profissão do mundo, o Agente Penitenciário permanece à mercê dos riscos de sua profissão não somente em seu local de trabalho, mas também fora dele. Nossas polícias, investigativas e ostensivas, realizam a prisão. Nós, permanecemos com a custódia e convivência diária com o preso, algumas vezes durante grande parte de nossos anos de trabalho. É do Agente Penitenciário que o recluso ouve muitos nãos, a cobrança da disciplina e o tom autoritário e firme necessário no meio de trabalho. É o Agente Penitenciário que, no momento da clausura, representa todas as forças policiais e judiciais que o prendem e aquele a quem o tempo de custódia permite conhecer e fixar plenamente a fisionomia e, muitas vezes, maiores detalhes sobre família, hábitos e endereços. São os índices nacionais de reincidência que nos mostram que a grande maioria dos custodiados do sistema penal a nível nacional, não retornam à sociedade dispostos a reconstruir uma nova vida. Quando em liberdade, reintegrados ao crime e bem armados, tornam-se uma ameaça ao cidadão de bem e, como bem visto no último ano, principalmente aos agentes de segurança pública. Institucionalizados pelo crime, investem pesadamente contra as forças de segurança pública, causando centenas de mortes gratuitas, como presenciado durante o ano de 2012 em diversas cidades brasileiras. Vítimas de sua própria atuação em favor do Estado, agentes de segurança viram alvos. Todavia, diferentemente de Policiais Militares e Civis, via de regra reconhecidos pela sua farda, o Agente Penitenciário traz contra si a própria fisionomia, facilmente identificável pelos longos períodos de convivência no seio de uma unidade prisional, sabe-se, em qualquer lugar do Brasil, longe das condições ideais de lotação e estrutura, que amplia os níveis de estresse e animosidade entre reclusos e agentes. Não tratam-se de especulações, previsões ou números avulsos as referências supracitadas. Dados reais, estatisticamente comprovados, nos mostram que somente na última década, mais de dois mil agentes penitenciários morreram sem que estivessem em condições de se defender. No ano passado, de janeiro a outubro, 229 (duzentos e vinte e nove) agentes de segurança pública foram mortos no Brasil. Destes, 183 (cento e oitenta e três), estavam em folga no momento do crime, ou seja, 79% destes profissionais que arriscam suas vidas pelo bem do Estado, estavam fora do seu local de trabalho quando foram mortos e, muitas vezes, em suas próprias residências. Ainda que não bastassem esses números para convencer a qualquer cidadão de que o porte de arma ao Agente Penitenciário em folga deveria ser um direito há muito concedido, o Estado de Santa Catarina, infelizmente, muito tem a contribuir para esta comprovação. A Agente Penitenciária Deise Fernanda Melo Pereira Alves, num crime de grande comoção em todo Estado, foi brutalmente assassinada quando chegava a sua residência, durante o seu período de folga. Não sendo apenas parte de mais um número estatístico, o caso Deise contém uma peculiaridade que parece nos alertar para a importância deste tema. Legalmente armada e mesmo alvejada, Deise teve tempo de reagir e conseguir disparar um tiro em seu assassino, fato este que possibilitou a elucidação do crime. Ferido, o criminoso buscou socorro médico e pode ser identificado, levando ao indiciamento mais de dez envolvidos que, hoje, estariam impunemente livres, não fosse o fato de Deise estar devidamente armada e habilitada para reação, fora do seu horário de serviço. Digno de menção, ainda, se faz outro conhecido caso que envolve um Agente Penitenciário catarinense armado em sua folga. Durante um assalto em um estabelecimento comercial em junho do ano passado, o profissional, devidamente treinado e capacitado para ocasiões como essas, reagiu oportunamente, recebendo do Judiciário o devido e justo amparo: “Consoante manifestação do Ministério Público, dos autos não se encontram elementos suficientes a justificar a deflagração da ação penal, porque comprovado que o óbito de Jesiel Miguel dos Santos ocorreu mediante ação coberta pelo manto da legítima defesa e estrito cumprimento do dever legal (…)” (Autos nº 023.12.037462-8. Vara do Tribunal do Júri da Capital. Juiz Paulo Marcos de Farias. 18 jul 2012). Note-se que em ambos os casos foi possível notar perícia e conhecimento na ação dos agentes penitenciários envolvidos. Não casualmente, este é apenas um reflexo da atuação da Academia de Justiça e Cidadania, a ACADEJUC, no sistema prisional de Santa Catarina. Obviamente, nosso Estado preocupa-se em oferecer o devido treinamento para que nossos Agentes Penitenciários tenham um desempenho de excelência em situações onde seja necessário o uso de arma de fogo. A ACADEJUC já ofereceu formação a mais de 60% de nosso efetivo em seus dois anos de existência, e pretende alcançar sua totalidade ainda este ano. Além da formação inicial e continuada em técnicas operacionais, nossos profissionais tem a oportunidade de capacitação desde o uso de revolver calibre .38 à Pistola calibre .40 e Espingarda Calibre 12. Isso somente para ilustrar que o fato de que a aprovação do Projeto de Lei que concederá ao Agente Penitenciário o direito de portar arma de fogo para sua proteção pessoal e familiar, não se dará para profissionais despreparados e sem o devido preparo técnico. O direito ao porte será responsavelmente subjugado à exaustiva capacitação do Agente Penitenciário junto à ACADEJUC e à devida avaliação psicológica que avaliará as condições do profissional no crivo do critério técnico/científico, objetivando selecionar os profissionais que apresentem as condições adequadas para uso e manuseio de arma de fogo, frente às exigências de ordem psicológica e emocional, e não apenas como um exame para mero capricho do administrador. O profissional terá ainda o controle de validade e avaliação constante de sua capacitação junto ao Setor de Gerenciamento de Armas da Secretaria de Estado da Justiça e Cidadania, o SeGARM, que mantém programas de treinamento, capacitação e avaliação do porte de arma dos Agentes Penitenciários catarinenses. Todo este processo de treinamento e avaliação dos profissionais que portarão armas será intermediado por instrutores e psicólogos preparados e devidamente credenciados pela Polícia Federal, conforme prevê toda a legislação federal e em respeito à toda a normatização vigente. É baseando-me em todo o exposto que não encontro motivos que justifiquem o veto presidencial ao referido Projeto de Lei e, oportunamente, em nome de todos os Agentes Penitenciários catarinenses, rogo à Bancada Federal de Santa Catarina a manifestação pela derrubada do veto da Presidenta Dilma Rousseff ao Projeto de Lei nº 87/2011. Florianópolis, 29 de janeiro de 2013. Leandro Antônio Soares Lima – Agente Penitenciário – Diretor do DEAP